terça-feira, janeiro 30, 2007

Para quem acha que o Belenenses é um clube de direita


Acontece-me amiúde ouvir o seguinte comentário: "O quê? [sobrolho levantado e testa franzida] Tu és do Belenenses e és de esquerda? [contracção facial fácil demonstrando desdém]". Mais ainda, isto vem de notórios lagartos (que é nome que se dá aos adeptos do clube do Visconde, esse grande defensor da classe operária) ou de ferrenhos lampiões (nome que se dá aos adeptos do clube conseguiu, durante a ditadura, ser fascista e comunista ao mesmo tempo).

Pois a 30 de Janeiro de 1938 (comemoram-se hoje 69 anos) deu-se o acontecimento que tira todas as dúvidas sobre o assunto. Vê-se ali na foto acima, e é o mais antigo acto público de protesto contra a ditadura fascista em Portugal de que tenho conhecimento (o que não quer dizer que seja o mais antigo em absoluto), e foi levado a cabo por três jogadores do Belenenses: Amaro (histórico capitão de equipa), Quaresma (tio-avô do Ricardo Quaresma) e Simões. Na foto são os quarto, quinto e sexto jogadores a contar da esquerda. Estava para iniciar-se o jogo entre Portugal e Espanha, jogo não reconhecido internacionalmente devido à Guerra Civil Espanhola, e quando os jogadores da selecção nacional deveriam fazer a saudação fascista, os três jogadores do Belenenses não o fizeram. Quaresma simplesmente não levantou o braço, Amaro e Simões ainda mais provocatoriamente cerram o punho, em alusão à simbologia comunista. Foram todos interrogados pela PIDE a seguir. O mais caricato foi quando a revista Stadium tentou acrescentar uns dedos postiços a Amaro e Simões, o que só trouxe mais atenção ao protesto dos jogadores (ampliando a imagem talvez dê para ver). Quaresma conta a sua versão neste post do Henrique Amaral (mais para o fim).

Vale a pena referir ainda que o Belenenses é desde a sua génese um clube popular. Foi fundado por Artur José Pereira, numa cisão do Sport Lisboa e Benfica, porque Artur José Pereira - um puro - achou que o SLB já não correspondia ao clube do povo que fora outrora o seu percursor Sport Lisboa. O Belenenses continua a ser ainda hoje o clube popular de Artur José Pereira. Quando uma pessoa escolhe o seu clube (o que acontece por volta dos quatro anos) deve ter estes factores em conta. Eu debrucei-me, à época, afincadamente sobre o assunto, fiz inúmeras pesquisas na internet e cheguei à conclusão que o Belenenses é o clube que melhor se identifica com as minhas ideias. Quero lá saber que o mais ridículo portugês de sempre fosse adepto do Belém, somos um clube tolerante e só por caridade (e porque ele nos pagou a construção do nosso lindíssimo estádio) que não o pusemos com dono.

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segunda-feira, janeiro 29, 2007

Escolhe o teu Esquerdista preferido

O meu primeiro post no Peão vai ser sobre as eleições presidenciais em França (e palpita-me que não vai ser o último sobre o tema).
Há cinco anos Jean-Marie Le Pen conseguiu passar à segunda volta da eleições, ultrapassando Lionel Jospin. Apesar de gozar de uma boa imagem Jospin viu os votos da esquerda distribuídos por uma miríade de candidatos (o que não desresponsabiliza Jospin e p PSF da derrota). Este ano parece que o eleitorado "aprendeu" a lição e mais que provavelmente a candidata do PS, Ségolène Royal, vai beneficiar do voto útil, as sondagens apontam para mais de 30% à primeira volta, o que seria o dobro de Jospin em 2002.
A questão é de saber se os partidos à esquerda do PS "aprenderam" também alguma coisa, e quer-me parecer que não. A esquerda alternativa (quero dizer alternativa ao PSF) encontra-se num beco sem saída, se se verificarem as previsões das sondagens serão os grandes prejudicados pelo voto útil, se não for o caso arriscam-se a levar de novo a extrema-direita à segunda volta. A solução seria uma candidatura unitária que permitisse uma convergência dos vários partidos e movimentos de esquerda, que até já se vem desenhando desde o movimento anti-globalização. Seria uma excelente ocasião para o aparecimento de um novo movimento político à esquerda, com possiblidades de ter um expressão importante. Mas não foi o que aconteceu.
Alguns simplesmente apoiam Ségolène Royal, como Christiane Taubira (Parti Radical de Gauche), deputada guianesa que em 2002 ganhou muitos votos das Antilhas, e Nicolas Hulot apresentador de televisão ecologista que seria a figura mediática para uma candidatura dos "Verdes". No resto repete-se mais ou menos o cenário de 2002. Arlette Laguiller (Lute Ouvirère) decidiu candidatar-se pela sexta (!) vez às presidenciais, esteve desde início fora de qualquer possibilidade de convergência. O Partido Comunista (PCF) ainda tentou fazer crer que estaria interessado numa candidatura unitária. Foi lançada uma iniciativa conjunta com outros partidos e colectividades da sociedade civil para encontrar um candidato comum, fixou-se que seria um candidato de consenso e não eleito por simples maioria. O PCF recuperou os maus hábitos de comunistas, enviou militantes para as colectividades para tentar influenciar a escolha do candidato e forçou a mão. O PCF nunca esteve interessado numa candidatura conjunta, simplesmente quis aproveitar o movimento em benefício da sua própria candidatura, a de Marie-George Buffet. Nem quando viu que essa estratégia estava condenada desistiu, o resultado foi um estrondoso falhanço da candidatura unitária. Além de Buffet, que avançou sozinha, resultou deste falhanço também a candidatura Olivier Besancenot (Ligue Comuniste Révolutionaire), a candidatura dos Verdes, e muito provavelmente de José Bové. Pelos Verdes, com a retirada de Nicolas Hulot apresenta-se Dominique Voynet. José Bové, inicialmente tinha posto de parte uma candidatura por não ser consensual, mas neste cenário vai seguramente avançar. E espero não me ter esquecido de ninguém...
O que me incomoda nesta fragmentação é que uma esquerda que ser diz defensora de valores como a solidariedade e a tolerância não consiga viver com a diversidade. Vendo bem, todos estes candidatos se diferenciam muito pouco em termos do programa político, para o eleitor torna-se uma questão quase pessoal escolher entre um deles. Ainda assim, para mais sabendo que avançam para o suicídio político, continuam.
Mesmo sem acompanhar muito a cena política fora de Portugal e França, parece-me que não há muitos exemplos, se é que há de todo, de convergência entre a esquerdas alternativas como o Bloco de Esquerda em Portugal. Nitidamente o resultado é mais do que a soma das partes, mas é um exemplo que ninguém parece seguir, e em França está bem patente que não vai acontecer tão cedo.

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sexta-feira, janeiro 26, 2007

A Vez do Peão

O Peão é um novo blogue que surgiu há pouco, e para o qual fui convidado a participar. Aceito o convite, com muito gosto, e vou mandar a primeira posta em breve. Vou continuar aqui no Agreste Avena, vou andar cá e lá. Talvez algumas coisas sejam postadas aqui e lá, ou talvez não, talvez separe os temas dos posts num lado e noutro, e talvez no Agreste Avena mude um pouco o estilo, não sei, nem é muito importante agora.
Vou participar num blogue colectivo, com bloguers que aprecio bastante. Vai ser engraçado. Passem por lá e leiam, já há muito material, eu já lá vou ter não tarda.

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Citações (III)

"mais l'œuvre de l'homme vient seulement de commencer
et il reste à l'homme à conquérir toute interdiction immobilisée aux coins de sa ferveur
et aucune race ne possède le monopole de la beauté, de l'intelligence, de la force
et il est place pour tous au rendez-vous de la conquête"

Aimé Césaire, Cahier d’un retour au pays natal (1956)

tradução (minha):
"mas a obra do homem apenas agora começou
e falta ainda ao homem conquistar todas as interdições fixadas nos resquícios do seu fervor
e nenhuma raça possui o monopólio da beleza, da inteligência, da força
e é um lugar para todos o encontro marcado com a conquista"
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quinta-feira, janeiro 25, 2007

Quem faz investigação, quem a paga e quem beneficia?

Quem faz a investigação científica são em grande maioria instituições públicas, ou instituições privadas sem fins lucrativos. Ou seja, a investigação é numa enorme maioria paga por dinheiros públicos, ou seja de contribuintes, e por doações de beneméritos. Há excepções, como algumas áreas ligadas às tecnologias, mas seguramente não nas ciências biomédicas. A investigação que leva à descoberta de novos fármacos para combater qualquer doença é feita em laboratórios públicos, universidades, ou institutos de investigação fundamental, nunca nos laboratórios das empresas farmacêuticas. Se, por exemplo, se fizer uma pesquisa bibliográfica sobre os últimos desenvolvimentos no combate à SIDA pode verificar-se isso mesmo, se for o Cancro dá no mesmo, e por aí a fora. No entanto são as empresas farmacêuticas quem detém as patentes dos medicamentos que comercializam, e graças a isso podem estabelecer monopólios de determinados produtos. Para obterem as patentes as farmacêuticas têm duas possibilidades, podem pura e simplesmente comprar essas patentes aos investigadores que desenvolveram a pesquisa (o que me parece eticamente duvidoso, embora seja legal), ou então fazer ligeiras alterações aos produtos já existentes e patentear esse produto modificado (o que não passa de um estratagema). Acontece que essas modificações não alteram o efeito terapêutico, não trazem nada de clinicamente novo, mas podem tornar a produção mais fácil e mais barata.

A questão que a me parece importante - a mim e a muita gente - é saber se é legítimo uma empresa farmacêutica deter a patente, e logo o monopólio, de um produto que pode salvar vidas e é conseguido graças ao dinheiro de contribuintes (e beneméritos).

Vem isto a propósito de um processo em tribunal lançado pela Novartis, um gigante suíço da indústria farmacêutica, algo como a terceira maior do mundo, contra o estado indiano. A Índia tem uma lei de patentes que permite a produção de genéricos em larga escala, a preços reduzidos sem ter que sujeitar-se a autorizações das empresas farmacêuticas. Repare-se que a lei indiana nem sequer impede as patentes de medicamentos, simplesmente considera que alterações triviais de fármacos já existentes não merece uma nova patente. Para dar um exemplo concreto, uma alteração trivial é o aspegic em relação à aspirina, em vez de ácido acetil-salicílico tem-se acetil-salicilato de sódio, o que dá no mesmo. Se o produto original já tiver uma patente é essa patente que vale (o que até pode proteger as farmacêuticas em certos casos), se o produto original não tiver patente então as modificações também não são patenteadas e são de uso livre. A Novartis alega que esta lei é contrária às regras da Organização Mundial do Comércio (mas OMC), mas a OMC tem excepções às regras de propriedade intelectual específicas para os produtos farmacêuticos.

Se a Novartis ganhar o processo as consequências podem ser, serão seguramente, enormes, e quem vai ser prejudicado são aqueles que beneficiam hoje dos medicamentos a baixo custo produzidos na Índia. E a Índia está a tornar-se numa espécie de farmácia para o "terceiro mundo" (o que quer que isso seja), os medicamentos a baixo custo produzidos na Índia servem a muita gente, por exemplo 80% dos anti-retrovirais que a ONG Médicos Sem Fronteiras (MSF) usa nos seus programas de combate à SIDA vêm da Índia. Este processo judicial não é único, já em 2001 várias farmacêuticas, entre as quais a Novartis, moveram em conjunto um processo idêntico que acabaram por abandonar devido à intensidade dos protestos a nível internacional. Actualmente as outras farmacêuticas estão na expectativa, a ver para que lado cai, se a Novartis ganhar, outras moverão processos idênticos, Tal como fizeram em 2001, os MSF lançaram agora uma petição online contra este processo, e ao que parece a recolha das assinaturas segue a bom ritmo (a minha incluída), e lançaram outras iniciativas para fazer pressão sobre a Novartis.

Para quem quiser ler mais sobre o assunto, embora não esteja nas primeiras páginas dos jornais (o que tenho alguma dificuldade em perceber) há vários artigos disponíveis: Uma notícia na Nature (link só para assinantes, mas está aqui em PDF), uma no Le Monde, na Reuters em inglês e em português, e no site da ONG Oxfam.

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terça-feira, janeiro 23, 2007

Por um ponto-e-vírgula, f#$%-se!

Quem já veio aqui a este blogue usando o Internet Explorer deve ter reparado que havia um pequeno problema com o template (é o caso do meu amigo Anauel, veja-se o comentário ao post anterior). Pois correndo o risco de me expor ao ridículo vou contar a verdadeira estória, que não tem nada de excitante a não ser talvez o ridículo a que me exponho. Pois acontece que eu nem sou muito versado em html (coisa extremamente inútil para quem trabalha com genética e biologia molecular), mas deu-me na cabeça que aqui o Agreste Avena haveria de ter duas colunas, uma de cada lado do texto principal. O Blogger não tinha à época nenhum template disponível com duas colunas, ou seja, tive que inventar, o que me deu algum trabalho. Como não frequento o Explorer (eu sou um gajo muito Mac), isto foi tudo feito com o Safari e Firefox. Só mais tarde me apercebi que havia um problema com o Explorer, a coluna da direita sobrepunha-se com o texto principal, e o resultado era uma coisa feia (ver foto). A cena irritou-me um bocadinho, coisa pouca, mas já era tarde de mais, voltar atrás era demasiado trabalho. Lá fui amiúde fazendo as minhas tentativas de resolver o problema (o que no final de contas talvez não tenha sido menos trabalho), sempre sem sorte nenhuma - ainda para mais fazia um dia uma tentativa, só no dia seguinte é que via o resultado, ou a falta dele para ser mais exacto. Pus um aviso no cima da página a dizer que os outros browsers funcionavam nem, num de herói tipo "não quero saber do Bill Gates para nada!". Tretas, não conseguia era resolver a porcaria do erro com o html. Um dia lá pedi um PC emprestado, Ella emprestou-me o d'Ella, e ataquei-me ao problema usando o Explorer para ver se finalmente dava com a coisa. Não que eu tenha finalmente cedido à opressão do monopólio Windows, mas preocupava-me era esses dois terços da população que estavam privados de usufruir o Agreste Avena em toda a sua plenitude (sim, que eu sou um filantropo). Já não basta serem oprimidos pelo Bill Gates, ainda por cima ficam privados deste humilde blogue. Era nessas pessoas que esteve o meu pensamento o tempo todo. Lá me pus às voltas e a páginas tantas olhei para uma linha e pensei "olha falta ali um ';'..." (agora por extenso "olha falta ali um ponto-e-vírgula..."), e experimentei pôr lá o ';', e não é que a porra do ';' resolveu-me a merda do problema?!?! Isto dá-me vontade de me armar em maradona e escrever um post cheio de palavrões c%ß%lho! Tanta coisa, por um ponto-e-vírgula, f#$%-se!
Convenhamos também que o Explorer é um gajo um bocado burro. E foi isso que fez este situação arrastar-se tanto tempo. Pois quando eu explico ao resto da malta o template que eu quero - ao Firefox, ao Safari, ao Netscape, ao Opera - eles todos percebem o que quero dizer, mesmo sem o raio do ';', só o Explorer é que não percebe, é burro. Mas logo é esse burro que a maioria dos leitores preferem vá-se lá saber porquê. Seja como for, já passou, agora podeis todos desfrutar deste blogue sem discriminações. Enjoy!

P.S. - Imagem sacada no Fragmentos Digitais (curioso isto de ir a outro lado sacar uma imagem do meu blogue...)

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domingo, janeiro 21, 2007

À grande e à Francesa: O conceito de contrepétrie

Isto quando se é imigrante, tentar perceber a cultura de um outro povo, além de um necessidade prática não negligenciável, pode ser um desafio estimulante. O sentido de humor é, na minha humilde opinião, um inestimável recurso, incomparável fonte de informação. Pergunto-me amiúde sobre os outros "O que é que os faz rir?". Neste busca encontrei a Contrepétrie, é assim um género de trocadilho com que os franceses se divertem, e - mais importante - que eles próprios vêm como sendo algo muito francês. Consiste em encontrar frases que trocando-se-lhes de posição apenas uma sílaba, ou um som, altera-se completamente o sentido da frase. Para ser uma boa contrepétrie deve transformar-se uma frase banal e inocente numa outra muito menos recomendável, o objectivo é mesmo perverter a frase inicial. E o gozo está em conseguir com o mínimo toque, tão subtil quanto possível, obter o máximo de efeito. É aí que reside a essência da coisa, porque corresponde ao arquétipo do estilo (essa obsessão nacional).
Dando como exemplo a contrepétri mais famosa no mercado: "Je te laisse le choix dans la date" (deixo-te a escolha da data). O indivíduo põe um ar inocente, alega uma pretensa dislexia e troca os sons do "ch" e "d", foneticamente a frase fica: "Je te laisse de doigt dans la chatte" (deixo-te o dedo na rata). Lá está uma contrepétrie perfeita. Ainda outro exemplo "Le Fakir est parvenu à passer par la Chine" (O Faquir conseguiu passar pela China) trocando o "p" e o "ch" fica "Le Fakir est parvenu à chier par la pine" (esta vou abster-me de traduzir). De facto percebo-os muito melhor agora...

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quinta-feira, janeiro 18, 2007

Citações (II)

"C'est ça que les journalistes ont parfois du mal à saisir. Un spectateur peut, le lundi, voir le Disney, et le mardi, le Woody Allen. C'est la même personne(...)"
Luc Besson em entrevista ao A Nous Paris (Dezembro, 2006)

tradução (minha): "É isso que por vezes os jornalistas têm dificuldade em perceber. Um espectador pode, segunda-feira, ver um filme Disney, e terça, um Woody Allen. É a mesma pessoa (...)"
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quarta-feira, janeiro 17, 2007

Música do CPE: Ah!, gloriosos anos...

Já vai sendo altura de mudar a música ali da JukeBox da coluna da direita. O meu parceiro do CPE, que é um gajo porreiro, escolheu e escolheu bem. Decidiu levar-nos (falo na primeira pessoa do plural referindo-me aos que já temos idade para ir vendo alguns cabelos brancos nas nossas cabeças, ou noutros casos a falta deles) de volta aos nossos anos de teenagers. Vai daí o Belo manda-me um clássico do Rock Português, devidamente assinalado por uma comenda do 10 de Junho aqui há uns anos, de que eu por acaso até tenho o original em Vinil (e nem sei muito bem como é que vou conseguir passar para MP3, mas isso é outra conversa). Toca a partir de agora "Contentores" dos "Xutos e Pontapés", do álbum "Circo de Feras" de 1987 (já foi há vinte anos, porra!). E é melhor eu ficar por aqui que a escrita está-me a resvalar para a inconsssiência - com três S's, os mais velhos talvez se lembrem ainda da piada....

Ficam aqui a letra e a música:



Contentores
Xutos e Pontapés

A carga pronta metida nos contentores
Adeus aos meus amores que me vou
P'ra outro mundo
É uma escolha que se faz
O passado foi lá atrás

A carga pronta metida nos contentores
Adeus aos meus amores que me vou
P'ra outro mundo
Num voo nocturno num cargueiro espacial
Não voa nada mal isto onde vou
P'lo espaço fundo

Mudaram todas as cores
Rugem baixinho os motores
E numa força invencível
Deixo a cidade natal
Não voa nada mal
Não voa nada mal

Pela certeza dum bocado de treva
De novo Adão e Eva a renascer
No outro mundo
Voltar a zero num planeta distante
Memória de elefante talvez
O outro mundo

É uma escolha que se faz
O passado foi lá atrás
E nasce de novo o dia
Nesta nave de Noé
Um pouco de fé
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segunda-feira, janeiro 15, 2007

Quem vota NÃO vota em quê?

Quem votar NÃO no referendo vai estar a votar no Status Quo actual: pode praticar-se o aborto livremente, desde que seja clandestino. O que incomoda quem anda a fazer campanha pelo NÃO não é a prática do aborto, apenas a sua legalização. O que os move não é a defesa da vida que dizem sagrada, querem apenas que o aborto não tenha uma legitimação legal, política e social. Pode fazer-se o aborto à vontade desde que não se veja, é essa a realidade do país há décadas (ou será séculos) e parece não incomodar os apoiantes do NÃO. É essa a realidade que vai manter-se se não ganhar o SIM.
Não devemos subestimar uma questão cultural que joga aqui um papel importante; a contradição que existe entre o que são os princípios morais e o que é a praxis. Há princípios que podem não ser respeitados desde que não se assuma, e se continue - claro! - a carregar o estigma da culpa. Não que isso seja exclusivo da cultura portuguesa (longe disso), mas encaixa-se muito bem. Dei-me conta disto quando discutia há pouco com alguém que hesitava entre votar SIM e votar NÃO. Pesava a favor do SIM o não querer que as mulheres vão presas, a favor do NÃO o manancial do costume (mas sem grande convicção), e diz-me a certa altura "De qualquer modo não há nenhuma mulher presa por praticar o aborto". Há pelo menos um dos movimentos pelo NÃO que usa este argumento (aliás, tem sido recorrente como refere o Rui Tavares na crónica do último sábado). Pergunto eu: Como é que se pode usar como argumento a favor da manutenção da lei actual o seu incumprimento? Contradição? Incoerência? Esquizofrenia? Ou todas? Os apoiantes do NÃO nada fizeram para que a lei actual seja efectivamente cumprida. Nada fizeram contra os praticam o aborto clandestino. A lei actual nada resolveu até agora, nem há-de resolver, mas mobilizam-se para mantê-la, o que só pode ter como consequência deixar as coisas como elas estão. Não aceito e não uso o argumento de que o aborto deve ser legalizado pelo simples facto de que ele existe e não pode ser erradicado, mas o que se exige é coerência daqueles que se dizem contra o aborto. Se acham que lei actual é boa então façam alguma coisa coisa para que seja cumprida, denunciem à polícia as mulheres que praticam o aborto, mandem-nas para a cadeia, façam manifestações a favor da condenação dessas mulheres quando elas vão a julgamento, façam pressão política para que a lei seja cumprida, façam petições, façam qualquer coisa. É isso que fazem os apoiantes do NÃO? Nada disso, há até quem vote NÃO já tendo praticado o aborto. Histórias como aquelas narradas neste post da Fernanda Câncio no Glória Fácil também conheço. Certa vez, antes do referendo de 1998 discutia (acaloradamente) com colegas sobre o assunto, até que uma delas confessou já ter feito um. Como sempre a situação dela era especial (como se as outras não fossem), que era culpa da médica, e mais não-sei-quê, e que votava NÃO. Acho que histórias destas não faltam para aí. Claro que estas pessoas acham legítimo que se pratique o aborto, o que não acham legítimo é que seja legalizado, que seja socialmente aceite, que deixe de ser feito às escondidas, que deixe de ser estigmatizado, que deixe de ser crime.
Eu pessoalmente não gosto de contradições, especialmente nas leis, especialmente quando tem as consequências que tem esta contradição. Se a lei não é para se aplicar, então é porque não é boa, mude-se a lei. Se é aceitável a pratica do aborto então que seja feita em condições de higiene e segurança. Se há circunstâncias especiais em que se justifica a interrupção da gravidez, então que a mulher (ou o casal) tenha o direito de tomar essa decisão, e que isso deixe de ser um crime.

Adenda: Monsenhor Luciano Guerra, reitor do santuário de Fátima, explica melhor do que eu o que quero dizer. Vejam aqui ou aqui

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domingo, janeiro 14, 2007

Etnografia comparada

Em Inglaterra não se pode ter o bolo e ter comido o bolo (you can not eat the cake and have it) - Lapaliciano.
Em França não se pode ter a manteiga e o dinheiro da manteiga (on ne peut pas avoir le beure et l'argent du beurre) - Pragmático.
Em Portugal não se pode ter sol na eira e chuva no nabal - Bucólico-Poético.
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sábado, janeiro 13, 2007

Pequenas perguntas sem importância (III)

Porque é que a Rue des Crèpes aparece em todos os mapas e moradas oficiais indicada como Rue du Montparnasse?

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sexta-feira, janeiro 12, 2007

Quando a realidade ultrapassa a ficção (científica)

Hoje em dia já é possível ao cérebro humano ouvir música sem que seja produzido som algum. Numa pessoa que tenha um implante coclear o som é captado por uma unidade externa com um micro- mas verdadeiramente micro -fone e é transformado em formato digital, transmitido a um eléctrodo implantado na cóclea (daí o nome), este eléctrodo estimula a cóclea, mimetizando o que seria a transmissão normal do som pelo ouvido interno, e finalmente a cóclea transmite ao cérebro naturalmente por via nervosa. Se a pessoa que tem um implante coclear tiver também um iPod pode ligá-lo directamente à unidade externa do implante coclear através de uma pequena ficha, ou seja sem passar pelos auscultadores nem pelo microfone. Ora, as músicas que estão no iPod são ficheiros, logo estão em formato digital, são transmitidas ao implante que as recebe, também em formato digital, e que as transmite ao eléctrodo que transmite à cóclea que transmite ao cérebro, ou seja passa de digital a impulso nervoso, sem nunca ser produzido som. Mas a pessoa ouve a música, mesmo não havendo som há a percepção do som pelo cérebro, que é o que interessa. E quem diz um iPod, diz ligar a um computador para falar no Skype, ou um telemóvel, ou uma aparelhagem Hi-Fi, na realidade tudo o que tenha uma ficha para ligar os auscultadores.
É um admirável mundo novo que anda por aí, e que nem damos conta. Mas o mais admirável é que o implante coclear se destina a surdos, esta forma virtual de transmitir o som possibilita-lhes talvez algo que de outro modo era impossível. Para eles este não apenas uma qualquer alternativa, é a única maneira possível de ouvir música.

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terça-feira, janeiro 09, 2007

O céu é o limite...

Tudo começa quando o Sr. Gilette inventa a primeira lâmina de barbear descartável, a coisa deu para as encomendas durante umas largas décadas. Um dia alguém se lembra que talvez duas lâminas seja melhor do que apenas uma, abriu-se uma Caixa de Pandora. Não tardou muito que alguém se lembrasse que talvez três lâminas seja melhor do que duas, o que desencadou em mim não mais que um sorriso condescendente como quem pensa "estes gajos lembram-se de cada coisa...". Não obstante o desenvolvimento e o progresso continuam imparáveis e vorazes por entre faixas lubrastrip e suspensões activas. Preplexo vejo num ápice passar-se para quattro lâminas, em titânio e tudo. Nem tempo tenho para respirar, o ritmo acelera-se ainda mais, chegamos a cinco lâminas, e com vibrador. Pergunto-me apenas: onde é que isto vai parar?

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sábado, janeiro 06, 2007

A Royal candidata à presidência

Apesar das minhas reticências rendo-me ao talento político de Ségolène Royal. O mais recente exemplo é o vídeo que lançou na internet a desejar um bom ano novo aos franceses (podem ver o vídeo no fim do post). Num vídeo caseiro, que o Le Monde descreve de forma sublime como "falsamente amador", diz o que os franceses querem ouvir e do modo que os franceses querem ouvir, e faz passar uma mensagem política num tom bem afável. Mas este vídeo é apenas um exemplo, nos últimos meses a subida de Ségolène tem sido notável, e o mérito vai todo a estratégia que desenhou. Quando escrevi o tal post criticava sobretudo falta de comparência de Ségolène ao debate político, dizia-me um amigo francês, declarado simpatizante de Royal, que isso só demonstra que ela sabe muito bem para onde quer ir. Vejo-me obrigado agora reconhecer a razão desse meu amigo. Reconheço sobretudo o realismo e pragmatismo de Ségolène, que me parece agora perfeitamente capaz de bater o candidato da direita (provavelmente Sarkozy) na segunda volta. Apresentou-se ao debate na altura certa, evitou expor-se em demasia antes de tempo, e absteve-se de participar em quezílias que só deperstigiam todos os que nelas participam. E embora não me reveja em algumas das suas posições, o seu posicionamento é demasiado ao centro para meu gosto, agrada-me a sua maneira de fazer política. Ségolène aparece em defesa da democracia participativa, numa sociedade francesa que, apesar de muito politizada e com uma sociedade civil bastante activa, tem uma tradição política bastante institucional e fechada. Incitava há pouco tempo (lamento mas perdi o link) os militantes socialistas a fazerem campanha discutindo nas associações locais, nos seus bairros, nos cafés, e fala-se em lançar uma iniciativa "tipo estados gerais" para recolher as opiniões dos cidadãos e inclui-las no seu programa político. Este modo de fazer política contrasta bem com as costumeiras campanhas à base de autocolantes, panfletos e sacos de plástico. Mais ainda, vem na sequência das iniciativas que já tinha tido na internet, outra das suas inovações na maneira de fazer política. Agora que chegou a altura Ségolène não teme os debates difíceis, como não temeu fazer uma viagem ao Médio Oriente para dar a conhecer os seus pontos de vista sobre os problemas da região, mas sobretudo para ouvir os intervinentes.
Nos últimos tempos, mais precisamente desde as eleições primárias dentro do PSF, houve uma inversão das posições, o que fez com que Sarkozy ande agora a reboque d as iniciativas de Ségolène Royal. Sarkozy teve até que tirar da manga à última da hora uma eleição primária que o legitimasse dentro do próprio partido, onde foi afinal - imagine-se! - candidato único. Já Ségolène apresentou-se contra dois candidatos à partida fortes dentro do Partido Socialista, Strauss-Kahn e Laurent Fabius, os três debateram os respectivos programas em várias ocasiões diante dos militantes socialistas, e foram debates genuínos, por vezes até crispados (não da parte de Ségolène, que é a calma em pessoa). O resultado é conhecido, Royal ganhou à primeira volta com mais de 60% dos votos dos militantes. Esta vitória deu, para além de uma autêntica legitimidade, um impulso para uma dinâmica de vitória à campanha de Ségolène, projectou-a como uma candidata com reais possibilidades de ganhar as eleições. A realização de primárias no seio do próprio partido, bastante rara na Europa (ao contrário dos E.U.A. - esperemos que a moda pegue), foi antes de mais uma estratégia da direcção do PSF e particularmente de François Hollande, e é a ele que deve ser dado o mérito, se bem que todos os candidatos tenham aderido de bom grado. Para além de permitir o debate democrático no interior do partido, neste caso particular teve ainda outra consequência que pode vir a ser importante para o decorrer da campanha: milhares de novos militantes aderiram ao PSF agradados com a ideia de poder participar na escolha do candidato às presidenciais. Isto é uma verdadeira benção para um partido que quer por uma máquina de campanha em marcha e mobilizar os militantes para uma eleição que se adivinha difícil.
Nas últimas sondagens Ségolène Royal continua a subir na intenção de votos à primeira volta, e consegue numa segunda volta recolher mais votos do que o somatório da esquerda na primeira, o inverso de Sarkozy.



P.S. - O que eu não percebo é que se diga ou insinue, por manifesta misoginia, que o maior talento político de Ségolène é a sua beleza, ainda para mais ela nem muito bonita.

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sexta-feira, janeiro 05, 2007

Citações (I)

"Remember that truth alone is the matter that you are searching after; and if you have been mistaken, let not vanity seduce you to persist in your mistake."

Henry Baker, in The Microscope Made Easy (1742)


tradução (minha):"Lembra-te que a verdade e apenas a verdade é o objecto que procuras; e se tiveres errado, não deixes que a vaidade te seduza a persistir no teu erro"

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quinta-feira, janeiro 04, 2007

Pequenos pormenores...

Toda e qualquer morte de um ser humano é lamentável, mesmo a do mais sanguinário dos ditadores. Toda e qualquer condenação à morte é um erro, mesmo a do mais sanguinário dos ditadores, sobretudo a do mais sanguinário dos ditadores. Não dar ao ditador o mesmo tratamento que ele deu às suas vítimas seria uma demonstração de superioridade moral da nova ordem que se quer democrática, livre e justa. Pelo contrário as novas instituições iraquianas, e por arrastamento o aliado/invasor americano, pelo tratamento indigno que deram a Saddam Hussein rebaixaram-se ao seu nível. A pressa com que quiseram executá-lo, findo o julgamento, relembrou-me a execução de Ceausescu. Concordo portanto inteiramente com este post do Ivan Nunes no 5dias. Não tenho quase nada a acrescentar senão um pequeno pormenor que não sendo propriamente chocante não deixa de me surpreender, e na minha opinião reveste-se de um enorme simbolismo. Os homens que executam Saddam nem sequer estão fardados. É uma convenção (digo eu) universal: em qualquer lugar onde há um Estado (e não digo Estado democrático, digo Estado simplesmente) os agentes encarregues de fazer cumprir a lei em nome desse Estado têm uma farda que os identifica como representantes desse Estado. Sendo a execução do antigo ditador um momento crucial na fundação de uma nova ordem no Iraque, seria de esperar alguma solenidade. Pelo contrário, temos um tratamento indigno do condenado, com impropérios e gritos de alegria de homens encapuçados, num ambiente austero entre paredes de betão, filmado por um amador com telemóvel. Quem não soubesse tratar-se de Saddam Hussein poderia pensar que as imagens eram antes da execução de um refém ocidental por uma célula da Al-Qaeda no Iraque.
Atendedo aos pequenos pormenores esta execução dá uma péssima imagem de um governo que quer dar apresentar-se como democrático e legítimo representante de todos os iraquianos.

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quarta-feira, janeiro 03, 2007

Será que em 2007...?

- As mulheres portuguesas vão puder escolher, e praticar a interrupção voluntária da gravidez em condições de segurança e higiene, sem receio de serem presas?

- Os EUA vão sair do Iraque e entregar um país estável, sem atentados, a um governo democraticamente eleito?

- A União Europeia vai sair do marasmo pós-constituição e retomar o processo de integração?

- Israelitas e Palestinianos vão chegar a um acordo para por termo ao conflito, e viver ambos em paz e com dignidade?

- Uma mulher moderadamente à esquerda vai ser eleita presidente da república em França? Ou será um homem desmesuradamente à direita?

- As emissões de CO2 vão diminuir? E a temperatura vai descer?

- Vão ocorrer progressos significativos na investigação com células estaminais?

- O novo secretário geral da ONU vai estar à altura do seu predecessor?

- Cavaco Silva vai dizer ou fazer alguma coisa de substancial?

Ou sou um optimista ou é da época, mas acho que grande parte destas questões vão ter respostas positivas (se bem que de Cavaco já não espero nada).

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