sábado, janeiro 06, 2007

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A Royal candidata à presidência

Apesar das minhas reticências rendo-me ao talento político de Ségolène Royal. O mais recente exemplo é o vídeo que lançou na internet a desejar um bom ano novo aos franceses (podem ver o vídeo no fim do post). Num vídeo caseiro, que o Le Monde descreve de forma sublime como "falsamente amador", diz o que os franceses querem ouvir e do modo que os franceses querem ouvir, e faz passar uma mensagem política num tom bem afável. Mas este vídeo é apenas um exemplo, nos últimos meses a subida de Ségolène tem sido notável, e o mérito vai todo a estratégia que desenhou. Quando escrevi o tal post criticava sobretudo falta de comparência de Ségolène ao debate político, dizia-me um amigo francês, declarado simpatizante de Royal, que isso só demonstra que ela sabe muito bem para onde quer ir. Vejo-me obrigado agora reconhecer a razão desse meu amigo. Reconheço sobretudo o realismo e pragmatismo de Ségolène, que me parece agora perfeitamente capaz de bater o candidato da direita (provavelmente Sarkozy) na segunda volta. Apresentou-se ao debate na altura certa, evitou expor-se em demasia antes de tempo, e absteve-se de participar em quezílias que só deperstigiam todos os que nelas participam. E embora não me reveja em algumas das suas posições, o seu posicionamento é demasiado ao centro para meu gosto, agrada-me a sua maneira de fazer política. Ségolène aparece em defesa da democracia participativa, numa sociedade francesa que, apesar de muito politizada e com uma sociedade civil bastante activa, tem uma tradição política bastante institucional e fechada. Incitava há pouco tempo (lamento mas perdi o link) os militantes socialistas a fazerem campanha discutindo nas associações locais, nos seus bairros, nos cafés, e fala-se em lançar uma iniciativa "tipo estados gerais" para recolher as opiniões dos cidadãos e inclui-las no seu programa político. Este modo de fazer política contrasta bem com as costumeiras campanhas à base de autocolantes, panfletos e sacos de plástico. Mais ainda, vem na sequência das iniciativas que já tinha tido na internet, outra das suas inovações na maneira de fazer política. Agora que chegou a altura Ségolène não teme os debates difíceis, como não temeu fazer uma viagem ao Médio Oriente para dar a conhecer os seus pontos de vista sobre os problemas da região, mas sobretudo para ouvir os intervinentes.
Nos últimos tempos, mais precisamente desde as eleições primárias dentro do PSF, houve uma inversão das posições, o que fez com que Sarkozy ande agora a reboque d as iniciativas de Ségolène Royal. Sarkozy teve até que tirar da manga à última da hora uma eleição primária que o legitimasse dentro do próprio partido, onde foi afinal - imagine-se! - candidato único. Já Ségolène apresentou-se contra dois candidatos à partida fortes dentro do Partido Socialista, Strauss-Kahn e Laurent Fabius, os três debateram os respectivos programas em várias ocasiões diante dos militantes socialistas, e foram debates genuínos, por vezes até crispados (não da parte de Ségolène, que é a calma em pessoa). O resultado é conhecido, Royal ganhou à primeira volta com mais de 60% dos votos dos militantes. Esta vitória deu, para além de uma autêntica legitimidade, um impulso para uma dinâmica de vitória à campanha de Ségolène, projectou-a como uma candidata com reais possibilidades de ganhar as eleições. A realização de primárias no seio do próprio partido, bastante rara na Europa (ao contrário dos E.U.A. - esperemos que a moda pegue), foi antes de mais uma estratégia da direcção do PSF e particularmente de François Hollande, e é a ele que deve ser dado o mérito, se bem que todos os candidatos tenham aderido de bom grado. Para além de permitir o debate democrático no interior do partido, neste caso particular teve ainda outra consequência que pode vir a ser importante para o decorrer da campanha: milhares de novos militantes aderiram ao PSF agradados com a ideia de poder participar na escolha do candidato às presidenciais. Isto é uma verdadeira benção para um partido que quer por uma máquina de campanha em marcha e mobilizar os militantes para uma eleição que se adivinha difícil.
Nas últimas sondagens Ségolène Royal continua a subir na intenção de votos à primeira volta, e consegue numa segunda volta recolher mais votos do que o somatório da esquerda na primeira, o inverso de Sarkozy.



P.S. - O que eu não percebo é que se diga ou insinue, por manifesta misoginia, que o maior talento político de Ségolène é a sua beleza, ainda para mais ela nem muito bonita.

Arquivado em:Política