domingo, fevereiro 04, 2007

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O síndrome da mulher demasiado bonita

Conheço uma mulher, jovem, que é lindíssima, podia até ser top model. É inteligente, tem um bom currículo académico, e em geral a vida tem-lhe corrido, pode dizer-se, bastante bem! Dá-me a sensação que única infelicidade que lhe aconteceu é tudo nela ser assim tão sem mácula. É como que a sua prisão. Só a perfeição é aceitável, nada abaixo de perfeito pode ser tolerado. A sua existência é um permanente zelar pela sua imagem de perfeição. Tudo tem que ser perfeito. A roupa que veste tem que ser perfeita, veste-se bem, mas desportiva, casual, nunca roupa demasiado cara ou vistosa, seria uma demonstração de ostentação, exibicionismo, isso é imperfeito, ela tem que estar bem na sua pele, confortável e descontraída. Tem que dar a imagem que se veste bem, mas não liga muito a essas futilidades. O namorado também tem que ser perfeito, igualmente bonito, inteligente, bem sucedido e descontraído. Aquilo que diz também tem que ser perfeito, jamais arrisca fazer uma pergunta difícil pois poderia ser apanhada a fazer perguntas pouco pertinentes, e isso seria imperfeito. Quando diz algo incorrecto e lhe é chamada a atenção para isso, imediatamente nega, nota-se aliás uma enorme experiência no exercício desse contorcionismo que é explicar-nos que interpretámos mal o que disse e re-escrever o que realmente disse. Nunca arrisca contar uma piada, assim nunca conta piadas secas, e isso seria imperfeito. Contudo tem sempre um sorriso na cara, sempre jovial, fresca, solta, leve. Quando interpelada a tomar uma posição raramente se compromete, poderia acabar do lado errado, e isso seria imperfeito. Mas, claro, abre uma excepção quando se trata de uma posição consensual, aí adere ao consenso, pois encontrar-se só no grupo dos que não tomam posição quando a escolha é óbvia seria mal visto, logo imperfeito. A sua maneira de andar também tem que ser perfeita, tem que andar com elegância, mas sem ser espanpanante, um ligeiro gingar das ancas mas muito subtil, e sobretudo, oh céus!, evitar a vulgaridade. A sua maneira de olhar as pessoas quando fala com alguém tem que ser igualmente elegante e sóbria. Até a sua posição quando quando está sentada a trabalhar, se tiver que fazer uma escolha entre estar sentada confortavelmente e elegantemente, bem, nem sequer é um escolha, é uma obrigação. Faz pose em permanência, abomina a deselegância, e não se lhe conhece uma falha. De qualquer modo apontar-lhe uma falha seria deselegante, pior: insolente, e quem é insolente obviamente perde a razão, perde automaticamente a razão, está garantida assim a defesa contra que ouse apontar-lhe uma falha. O seu zelo pela imagem de perfeição é um notável esforço, titânico, sobre-humano. É impressionante a energia gasta nessa interminável tarefa. Visto do lado de quem é imperfeito é lamentável ver alguém nessa auto-infligida prisão (visto do lado de dentro estou certo que é bem diferente).
Mas conheço pior, há quem se lance nessa senda, sem sequer se aproximar vagamente da perfeição, aí o drama transforma-se em tragi-comédia.

Arquivado em:Posts duvidosos

2 Comments:

Blogger Animus Moth Escreveu...

Se há algum tempo atrás se dizia vivemos num mundo de plástico é cada vez mais evidente essa verdade (brotam que nem cogumelos).
Mas mais interessante é o exercício de descasque de pessoas assim. Ainda que dificil - pois por norma estão muito bem treinadas e, são elásticas ao ponto da evasão quase constante - é muito gratificante quando se descobre que afinal de plástico só têm parte do corpo. Os pés são invariavelmente de barro ! :)

Um abraço de um amigo que já não vês há muito tempo !

2:25 da manhã, fevereiro 06, 2007  
Blogger Zèd Escreveu...

Plástico de pés de barro, é isso!

Vi o meu amigo há pouco tempo, mas em foto :-)

9:41 da manhã, fevereiro 06, 2007  

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