quinta-feira, abril 13, 2006

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Foi você que pediu um QI?

Ultimamente tem havido razões para voltar a falar da velha questão de saber se a inteligência é determinada geneticamente ou não. Primeiro foi o trabalho risível, do ponto de vista científico de uma tal Prof. Lynn que deu direito a um artigo no Times online (a que cheguei através deste post do Conta Natura). Não vale muito a pena falar disso, excepto que eu gostaria de saber porque é que são "cientistas" destes que têm direito a aparecer nos jornais, como o Times.

Depois aparace outro artigo de Shaw et al na Nature de 30 de Março, com bastantes destaque. Teve direito a (links para assinantes) uma notícia e um comentário. E, de facto quando artigo aparece numa revista como a Nature tem, à partida, outra credibilidade. Convém dizer já de início que este artigo não aborda sequer a questão da componente genética da inteligência. Procura apenas encontrar características da anatomia do cérebro que estejam relacionadas com a inteligência. No futuro poder-se-ão, talvez, encontrar factores genéticos que controlem essas características anatómicas, e assim a inteligência.

Quando se discute se a inteligência determinada geneticamente ou por factores ambientais, é bom lembrar que um e outro não são mutuamente exclusivos. Não há dúvidas que factores ambientais, particularmente a educação influenciam a inteligência. Provavelmente há uma interacção, mais até do que uma simples adição, entre esses factores genéticos ambientais. Mas será que dois indivíduos sujeitos ao mesmo ambiente podem desenvolver inteligências diferentes consoante os seus genes? Confesso que gostaria que se viesse a demonstrar que os factores genéticos não são limitantes. Mas o que cada um gostaria que fosse a resposta é muito pouco, ou nada relevante. Para se chegar a uma resposta, num sentido ou noutro, são necessários os dados empíricos. E os trabalhos que se fizerem devem ser analisados e criticados numa base científica, e não numa base ideológica (o que não raras vezes é caso, quando se trata deste assunto).

Lendo o artigo de Shaw et al (pode ver-se aqui o resumo, e também um comentário neste post do Conta Natura), a questão é de saber se se demonsta uma correlação entre características anatómicas do cérebro e a inteligência. Intelgiência é um conceito vago e ambíguo, logo por definição uma variável impossível de estudar. O que os autores estudam como indicador da inteligência é o QI (queficiente de inteligência). Não vou aqui discutir se o QI mede efectivamente a inteligência ou não, é uma assunto sobejamente discutido (e nunca concluído), aceite-se que sim. E de facto, pelo que consigo ler, o artigo é convincente (disclaimer: sou biólogo mas não sou especialista, conheço algum do jargão mas não consigo ler tudo o que está escrito em "letras pequenas"). A amostra é grande (mais de 300 indivíduos), a análise é exaustiva, e os métodos estatísticos parecem ser utilizados cuidadosamente (mas disso então é que eu percebo pouco). O que o artigo conclui é que a inteligência está correlacionada com o aumento da espessura do córtex do cérebro. O córtex é, por assim dizer, a parede ou parte exterior do cérebro, que é onde estão a grande maioria das células nervosas. Ou seja não é pelo cérebro ser grande, ou o córtex espesso que uma criança vai ser inteligente, mas sim se a espessura do córtex aumentar significativamente no fim da infância.

Voltando à questão inicial, estes resultados sugerem que a inteligência é determinada principalmente pelos genes? Não me parece de todo! Pode até imaginar-se (e os autores referem algo parecido) que o cérebro é como os músculos, muito exercício faz aumentar a massa muscular, e diminuir o pneuzinho. É possível que este aumento na espessura do córtex cerebral seja um resultado do exercício intelectual. Aliás os artigo também refere que nas crianças estudadas há uma correlação entre a inteligência e o nível socio-económico. Será que o nível socio-económico também é determinado geneticamente? Ou será a inteligência (e indirectamente, a o desenvolvimento anatómico do cérebro) um resultado do estatuto socio-económico?


Arquivado em:Ciência