quarta-feira, julho 12, 2006

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Exemplar

Irrita-me um bocado quando alguém erra e depois se desfaz em desculpas e pede perdão, assim tipo confissão ao padre, uma vez absolvido pode voltar a errar. Tal como me irritam aqueles que nunca admitem quando erram. Zidane explicou-se hoje no Canal+ e na TF1 sobre os acontecimentos da final e não fez nem uma coisa nem outra. Reconheceu o erro, disse que era "Imperdoável" , desculpou-se perante as crianças e os educadores por o seu gesto não ser "uma coisa que se faça", mas quando se colocou a questão do arrependimento foi bem claro "Arrepender-me era reconhecer que o que a outra pessoa disse [Materazzi] se pode dizer, e isso eu não posso aceitar". Zidane errou, e simplesmente assumiu o erro, sem desculpas, sem arrependimentos.

Depois, em relação aos insultos que proferiu Materazzi, Zidane teve a decência de se escusar a reproduzi-los, dizendo sempre que foram extremamente graves. Aliás disse várias vezes que preferia levar um murro em cheio na cara a ouvir o que ouviu, referiu ainda que os insultos visavam a sua mãe e irmã e foram repetidos várias vezes. Zidane não falou explicitamente de insultos racistas por parte de Materazzi, mas também não negou. A certa altura sugeriu que quem quisesse saber que visse nos vídeos e arranjasse especialistas de leitura labial, o que como toda a gente sabe já foi feito e dessa análise saiu a tese de que o insulto envolvia a palavra "terrorista". O próprio entrevistador relembrou que essa análise já tinha sido feita, ao que Zidane não reagiu, fiquei com a sensação que anuía tacitamente com as conclusões. Mais ainda, no fim da entrevista à TF1 falou-se de racismo, e das iniciativas da FIFA neste mundial a esse respeito, Zidane aproveitou a deixa e estabeleceu um paralelo entre o seu desentendimento com Materazzi e as declarações do vice-presidente do Senado italiano (terá dito que Itália venceu na final uma equipa francesa de negros, islamistas e comunistas - e Zidane aqui foi veemente, porque de facto é grave), dizendo esse tipo de declarações são mais graves que uma agressão física. Fico convencido que os insultos de Materazzi além de visarem a mãe e irmã de Zidane foram também de cariz racista, eventualmente islamofóbico.

Zidane hoje fez também a sua defesa, que é até bastante simples, começando logo pelo facto de nunca contestar a justeza da expulsão, assume o erro e aceita a punição. No entanto o que Zidane argumenta é que nestes casos se pune sempre aquele que reage mas nunca aquele que provoca. E nisto Zidane tem inteira razão, aliás há muito quem diga que no futebol isto é normal e que Zidane devia estar preparado. É verdade que estas provocações são frequentes no futebol, mas não deviam ser normais, porque não são normais em mais lado nenhum. Imagine-se cada um de nós no seu meio profissional, qual seria a reacção se numa reunião de trabalho alguém com quem não concordamos se lembrasse de usar o insulto pessoal "só para destabilizar psicologicamente" com o objectivo de levar a sua avante? E se nos viessem explicar depois que na nossa profissão isso é normal e que não devemos reagir? Ridículo não é? Obviamente que noutro meio qualquer quem insulta leva com um processo disciplinar, pois porque não no futebol também? E se o vídeo serve de prova a posteriori para agressões e faltas duras que o arbitro não viu também deve servir para as provocações. É que o Fair Play quando nasce é para todos.

Arquivado em:Posts duvidosos