sábado, dezembro 30, 2006

Umas boas entradas, e não só...

Desejo a todos os leitores, para a o último jantar do ano, que tenham não apenas umas excelentes entradas, mas também excelentes aperitivos, excelentes pratos, excelentes sobremesas, excelentes vinhos e tudo o mais no menú. Assim por exemplo:

Aperitivo
Cocktail de salsichas do mundo

Entradas
Vieiras em molho de echalottes

Prato Principal
Vitela assada no tacho à francesa

Sobremesa
Cheesecake de Caramelo

Vinho
Bordeaux Château Sante Marie

Acabem o ano velho em beleza para começar o ano novo em Grande!

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Assim em jeito de balanço

O ano de 2006 foi em termos pessoais muito interessante, para além do muito da minha vida privada que vou poupar aos leitores, este ano ensinou-me pelo menos uma lição. Na realidade já desconfiava há uns tempos. Quando regressei temporariamente à pátria Lusa, depois de quatro anos de exílio no Pacífico Noroeste, a primeira coisa que me saltou à vista foi a tez morena das gentes da minha terra. Dei por mim a pensar "Estes gajos são mesmo escuros... quer dizer SOMOS mesmo escuros". Este ano, depois das viagens a África e às Caraíbas, tive a certeza para além de qualquer refutação razoável: nós portugueses somos pretos (cf. Araújo-Pereira, 2006), brancos são os suecos.

Bibliografia
Araújo-Pereira, R. "Orgulho 'beige'", Visão, 23 de Junho 2006, pp 153 (PDF aqui)

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quinta-feira, dezembro 28, 2006

Que parte da palavra de "Laicidade" é que ele não percebe?

A semana passada, nos seus votos de Natal, o papa Ratzinger voltou a condenar veementemente o casamento homossexual. À partida parece-me muito bem que o papa se manifeste contra a possibilidade do casamento religioso católico ser aberto aos homossexuais, é completamente coerente com a doutrina apostólica romana. Se bem que me surpreenda que o papa se preocupe com o assunto, nunca me chegou ao conhecimento que houvesse um movimento importante favorável ao casamento católico para os homossexuais. Continuando a ler a notícia percebe-se que a preocupação do papa são afinal as "teorias funestas" favoráveis ao casamento homossexual civil, que actualmente se discute particularmente em Itália mas também noutros países europeus. Ora aí temos um problema, e é um problema recorrente, este papa teima em não perceber (ou não aceitar, o que é ainda mais grave) o princípio de separação da religião e do estado. O direito dos homessexuais a um casamento civil é um assunto que diz respeito às intituições políticas, não à igreja católica. Haverá um modo de lhe explicar que o laicismo é um dos pilares da democracia?

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segunda-feira, dezembro 25, 2006

Um minuto de silêncio


James Brown (3 de Maio de 1933 - 25 de Dezembro de 2006)

Conseguiu ser, entre outras coisas, um monstro do palco até ao fim.

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sábado, dezembro 23, 2006

Pequenas perguntas sem importância (II)

Se eu acrescentar à tradicional portuguesinha receita de "Pastéis de Bacalhau" um Piment das Antilhas bem picante, isso é um atentado às tradições seculares ou uma inovação culinária?

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sexta-feira, dezembro 22, 2006

Alive & Kickin'

A princípio fico meio perplexo ao ler esta excelente entrevista dada pelo Miguel Esteves Cardoso ao José Mário Silva, nem sei muito bem o que pensar. Seja como for não consegui evitar ler do princípio ao fim, e a primeira conclusão é óbvia: O MEC está bem vivo, e recomenda-se!

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quinta-feira, dezembro 21, 2006

É mais importante encontrar o culpado ou a solução?

É sintomática a reacção dos defensores da política do governo Israelita em relação à Palestina. Está bem patente, por exemplo, nos comentários a este post no Arrastão: resume-se a atribuir as culpas aos Palestinianos, e acaba-se aí a questão. Fica por saber se vislumbram alguma solução para o problema, ou se isso é algo que nem os preocupa. A minha primeira reacção é (e foi o comentário que lá deixei): A culpa de uns não iliba a culpa de outros, o Hamas é um grupo terrorista e a Fatah um partido corrupto, mas isso não apaga as responsabilidades dos sucessivos governos de Israel, e de quem os apoiou, por terem criado as condições para que se chegasse à situação actual. Ninguém é Inocente nesta história, mas isso é afinal o que menos interessa.
É preciso ir além da católica questão da expiação da culpa. Importa saber sobretudo como é que se vai resolver o problema, e é essa a pergunta a que eu gostava que os incondicionais apoiantes do governo Israelita respondessem. Uma pergunta que se coloca a dois níveis. Primeiro ao nível dos princípios: Os Palestinianos têm ou não direito à autodeterminação e governar-se a si próprios? Têm ou não direito a um estado independente - efectivamente independente - e democrático, com governantes por si eleitos?
Depois coloca-se a questão ao nível pragmático: A política seguida pelo governo de Israel (de forma continuada, há vários anos) serve para atingir que objectivos? Com esta política a Palestina será um dia um estado viável? Com esta política Israel conseguirá um dia viver tranquilamente, e em Paz com os seus vizinhos?
As mesmas questões se colocam aos Estados Unidos e à Europa. Apoiar incondicionalmente o governo de Israel vai ajudar apaziguar o conflito? Vai fomentar a democracia na Palestina e no Médio Oriente? É essa a melhor maneira de defender os interesses da região (Israel incluída) a longo prazo? É a melhor maneira de defender os seus próprios interesses?
Independentemente de saber de quem é a culpa, será esta a melhor maneira de resolver o problema? De acabar com o conflito? Ou será que o problema não tem solução e é apenas natural que os Palestinianos se matem uns aos outros?

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terça-feira, dezembro 19, 2006

BiGoogle Brother is Watching You

Primeiro vi este filme, uma ficção sobre como o Google vai acabar com os jornais (cheguei lá através deste post do António Figueira no 5dias). Depois uma amiga minha que tem uma conta Gmail diz-me que a publicidade na coluna ao lado da janela onde lê e-mail é escolhida em função do conteúdo da própria mensagem. Quando recebe mensagem que fala de Biologia Molecular a publicidade é a produtos de Biologia Molecular, a probabilidade de as duas coisas acontecerem simultaneamente por mera coincidência é ínfima, é mais que provável que o Gmail tenha um algoritmo que lê as mensagens de e-mail e afixa a publicidade em função do que lê.

Agora aparece uma nova função, o Google Desktop Search. Vale a pena ler com atenção este relatório (em Francês) do CERTES, um organismo governamental francês de combate aos ataques informáticos. Vale a pena sobretudo ler o ponto 3, sobre as ameaças potenciais do uso desta nova função. Por exemplo os ficheiros indexados (e-mail, chats, páginas de internet visitadas, ficheiros Word, etc...) são copiados para um cache, e as cópias são guardadas, mesmo após a destruição do ficheiro original. Se a função for utilizada em multiposto os dados podem ser enviados para um servidor do Google. Os hábitos de navegação também são transmitidos ao Google e podem eventualmente ser fornecidos a terceiros. Em certas condições outros utilizadores podem ter acesso e pesquisar os ficheiros indexados. Mesmo os ficheiros Office protegidos por password e as páginas de internet seguras (https) podem ser partilhadas, a não ser que o utilizador defina especificamente que estes ficheiros não sejam indexados pelo GDS. E isto é apenas um resumo. A Dell entretanto assinou um acordo com o Google, e os novos computadores já são vendidos com o GDS.

É por essas e por outras que eu não gosto de cookies, e desconfio daqueles sites que insistem na instalação de cookies para poderem funcionar. A minha esperança é que seja demasiada informação para ser gerida, talvez ao tentar saber tudo sobre todos não consigam descobrir nada sobre ninguém.

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segunda-feira, dezembro 18, 2006

Pequenas perguntas sem importância (I)

Qual é a ortografia correcta: blogar ou bloggar?

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sexta-feira, dezembro 15, 2006

Não menos que uma Tragédia! (s.f.f.)

Um personagem como Pinto da Costa não pode simplesmente retirar-se tranquilamente de cena, e gozar a sua pacata reforma. Seria contrário às fundações desta civilização europeia que se quer herdeira de Gregos e Romanos. Pinto da Costa tem que cair com um imenso estrondo, tem que provocar ondas de choque, tem que causar danos colaterais, e inevitavelmente descer ao abismo. O homem pegou no FCP à beira de descer de divisão, conseguiu campeonato atrás de campeonato com sucessivas gerações de jogadores, conseguiu levar o FCP aos títulos europeus (o único clube português em mais de 40 anos). O homem é um génio, percebeu que uma boa equipe de futebol faz-se com bons jogadores, bons técnicos e uma boa estrutura desportiva, mas não só. Percebeu que um bom plantel se constrói também com bons empresários, bons árbitros, bons dirigentes federativos, associativos e ligativos. O homem percebeu que tem que se investir em todas a frentes e que estas não são mutuamente exclusivas, bem pelo contrário, costumam agir sinergisticamente, em quanto mais frentes se investir maiores são as probabilidades de ganhar. O homem desenvolveu estes conceitos perfeitamente inovadores, diria mesmo revolucionários, no futebol nacional e nada ficou como antes. Aliás o SLB, por exemplo, anda há anos, presidente após presidente, à procura do seu próprio Pinto da Costa, sempre com um notável insucesso. Pinto da Costa consegue o feito notável de ser admirado e idolatrado por 80% dos portugueses, e ser profundamente odiado e temido por 95%. Pinto da Costa não é indiferente a ninguém (a não ser talvez aos raros excêntricos que levam as crónicas no Vasco Pulido Valente a sério), ou se o ama, ou se o odeia, ou ambos. Pinto da Costa conseguiu a proeza de ser assediado pelos grandes partidos políticos à direita e à esquerda e ficar de bem com todos. Um personagem destes não pode simplesmente retirar-se discretamente de cena em paz com os anjos.
Talvez tenha chegado a hora do grand finale. O preâmbulo não podia ser mais prometedor, o desmoronamento começa com uma estória de saias, o princípio do fim é desencadeado por uma alternadeira mal agradecida. O devoto de Fátima cai em tentação e paga caro o seu pecado. O primeiro acto não fica atrás, começa com a entrada em cena da sebastiânica justiceira Maria José Morgado, a peça passa de prometedora a cativante. O espectador tem - como o próprio nome indica - expectativas que são agora elevadíssimas, o espectador quer sangue, e as expectativas não podem ser goradas. Os que o odeiam querem o sangue porque só no sangue haverá justiça, os que o amam querem sangue, pois que o sangue legitimará a sua revolta e a sua vingança. Resta, portanto, ao espectador sentar-se na sua poltrona, de preferência com um grande balde e pipocas, e assistir ao espectáculo de olhos esbugalhados. Tudo o que seja menos do que uma lancinante agonia digna das melhores tragédias gregas não é simplesmente aceitável. Se não forem cumpridas as expectativas o espectador deve imperativamente ser ressarcido do preço do seu bilhete.

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quinta-feira, dezembro 14, 2006

Temos Presidente!

Já lá vão um par de semanas que tomou posse o novo presidente eleito da República Democrática do Congo, Joseph Kabila, que já ocupava o cargo mas goza agora da legitimidade do voto. Contra as prováveis expectativas dos mais cínicos não se seguiu uma explosão generalizada de violência nem o Congo mergulhou de novo numa guerra civil (espero muito sinceramente não ter que engolir estas palavras mais tarde). Convém lembrar que o Congo fez um longo caminho para chegar aqui, e que estas eleições, mais do que o começo de uma nova fase, foram o culminar de um longo processo de transição para a Democracia. A guerra durou de 1997 até 2003, foi sangrenta, definida por alguns como a Terceira Guerra Mundial, pelo número de vítimas e países envolvidos (sim, foram muitas a ingerências dos países vizinhos). Contudo o cessar-fogo também não é de ontem, dura há já mais de três anos, e entretanto foi formado um governo de unidade nacional, foi elaborada uma constituição, foi montada a logística para a organização de eleições democráticas, foi feito um referendo à constituição, foram realizadas eleições para as províncias, para o parlamento, e para a presidência da república, esta a duas voltas. Na minha opinião o homem que foi decisivo para esta transição é o presidente agora eleito, Joseph Kabila, que herdou o poder - talvez o até próprio tenha ficado surpreendido - do seu pai quando este foi assassinado. Onde muitos congoleses (pelo menos os que conheço) gostariam de ter um chefe carismático e um líder forte, Joseph Kabila apresentou-se como um discreto diplomata, homem do diálogo e de compromissos. Conseguiu trazer as diferentes facções em conflito para a mesa das negociações, para o governo de unidade nacional e para a elaboração da constituição. Não menos importante conseguiu um envolvimento muito substancial da comunidade internacional - o maior contingente de capacetes azuis em África é o que está no Congo - para assegurar o bom desenrolar das eleições e da transição para a Democracia. Um trabalho notável sobretudo considerando a sua idade, 38 anos, é o mais jovem presidente em África. Joseph Kabila foi eleito presidente, e na minha opinião com todo o mérito.

A República Democrática do Congo é o 12º maior país do mundo em superfície (o que significa que em extensão faz mais de metade da Europa), tem mais de 60 milhões de habitantes, é um país riquíssimo especialmente em minérios (Urânio, Cobre, Ouro...) e ainda assim esta evolução política desperta muito pouca atenção dos meios de informação. Pior, quando noticiam as eleições é só para dar conta de um ambiente de tensão, sempre "temendo o regresso da violência ao país", ficando provavelmente o leitor convencido que o processo vai inevitavelmente abortar, e a guerra há-de recomeçar mais tarde ou mais cedo. Depois esquecem-se de acompanhar a evolução da situação, a não ser, claro!, que a violência regresse mesmo. Esquecem-se também que até nos países onde a transição para a Democracia foi pacífica, como Portugal ou Espanha, houve momentos de grande tensão. Este tratamento é particularmente acentuado quando se trata de África, como se fosse inerente à natureza dos africanos andarem sempre em guerra (talvez uma contagem ainda que grosseira do número de países africanos que estão em paz, e com regimes eleitos democraticamente resultasse uma agradável surpresa). Ainda outro dia o jornal "Le Monde", quase sempre um excelente jornal, punha na mesma notícia (sem link) as eleições presidenciais no Congo e as escaramuças entre militares no Kivu Norte, como se as duas coisas estivessem ligadas. Ora um bocadinho de trabalho de casa teria permitido encontrar facilmente algumas informações importantes: 1) o comandante das forças rebeldes no Kivu Norte não tem afiliação com nenhum dos candidatos às eleições 2) o Kivu Norte é só a província mais distante de Kinshasa, logo o local mais improvável para começar uma rebelião contra os resultados das eleições 3) Há regularmente escaramuças no Kivu Norte, seja em tempo de eleições ou não, sempre de reduzidas dimensão e contidas pelo exército regular e pelos capacetes azuis 4) o Kivu Norte fica (por coincidência?) mesmo junto à fronteira com o Ruanda, e o chefe das forças rebeldes General Nkunda é um Tootsie congolês (ok, talvez já seja demais esperar algum conhecimento das alianças e dos equilibrios de forças regionais...).

Parece-me que o Congo é um país suficientemente importante para merecer um pouco mais de atenção, e já agora, se não for pedir muito, que os jornalistas aprofundem um pouco mais a questão(enfim façam o seu trabalhinho) em vez de fazer se ficarem pelas análises superficiais e pelas ideias pré-concebidas.

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segunda-feira, dezembro 11, 2006

Domésticas e desesperadas?

"You know, you play pretty well for somebody with no real problems"

Bleeding Gums Murphy para Lisa Simpson, depois dela cantar "Lisa's Blues" (Do epsiódio "Moaning Lisa" dos Simpsons)

Há uns tempos, sem saber ao que ia, dei por mim a ver o filme "Comme t'y es belle!", uma suposta comédia romântica. De comédia tem pouco (e de romance apenas o previsível), mas é sobretudo uma recapitulação perfeita do déjà vu da mulher neurótica moderna. Pode ser impressão minha, mas esta ladainha de mulheres nos seus trinta, nevrosadas, descontentes com a sua vida, mas sem verdadeiros problemas, tem sido um estereótipo repetido até à náusea em filmes e séries de televisão. Senão vejamos; há um grupo de amigas, umas casadas outras não, nenhuma está contente com a sua vida sentimental. As casadas, têm um marido - nem seria preciso dizê-lo - que é um energúmeno anafado que só vê televisão, come no sofá, e não gosta de sexo. As solteiras saltam de namorado em namorado, verdadeiros D. Juan's sem sentimentos que fazem delas meros objectos, para depois as deixarem destroçadas, vitimadas. Nem umas nem outras têm emprego, mas são todas de classe social alta abonadas finaceiramente, e têm imenso tempo livre para poder carpir as suas mágoas.

Voilà, assim se constrói uma imagem da mulher moderna, histérica, angustiada, lamechas, que prefere queixar-se da vida do que resolver os (poucos) problemas que tem. Sobretudo uma mulher que transforma os seus dramas pessoais no mais grave problema da existência humana, e cuja existência se limita à procura de um marido perfeito. Este estereótipo incomoda-me, incomoda-me pelo que tem de redutor, incomoda-me pelo que tem de sexista, e incomoda-me sobretudo a glorificação desta imagem feminina. É este o modelo de virtude da mulher actual? É esta heroína moderna?

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sexta-feira, dezembro 08, 2006

A incrível estória do Dr. Jacky Chan

Há aqui em Paris uns habitantes eufemisticamente denominados SDF (sem domicílio fixo), andam um pouco por todo o lado e fazem parte da alma da cidade. Contudo chamar-lhes SDF ou sem abrigo induz-nos em erro, dado terem uma morada fixa que é Paris, a cidade é a sua casa e a paragem de autocarro o quarto. É uma casa grande e com muitos quartos que não se incomodam em partilhar. Pensar que os SDF são apenas pessoas com distúrbios mentais que carecem de apoio é monstruosamente redutor. Podem ser, nas suas mais diversificadas formas, os mais delirantes líricos, os últimos moicanos do romantismo, ou excêntricos em estado puro. Outro dia travei conhecimento com um deles, o Dr. Jacky Chan, numa paragem de autocarro do blvd. St. Michel. Tudo começou porque o Dr. Jacky Chan não consegue construir uma frase em francês, sim ele é americano de origem chinesa. Uma senhora, daquelas que provavelmente se consideram as autênticas parisienses, imbuída da mais honesta caridade cristã quis saber se já tinha comido. Aí eu entrei na estória no papel de intérprete (ou seria tradutor?), o Dr. Chan explicou-me que se acabara de levantar (já passava das 21h) e que ainda não tinha comido, logo tinha efectivamente fome. A caridosa cristã ofereceu-se para lhe ir comprar pão, e logo aí o Dr. Chan fez mostras da sua acuidade mental e rapidez de reflexos, disse-me rapidamente que não queria pão, preferia dinheiro porque sendo chinês estava com vontade mesmo era de ir a um traiteur chinês comer uma sopa. E nisto desaparece no meio do estaminé que tinha a ocupar o quarto, onde pontificava alguma parafernália propagandística anti-americana com uns slogans então incompreensíveis contra o FBI e a CIA, e volta logo de seguida com duas cópias de um panfleto a contar a sua história (cliquem na foto para ver). O Panfleto demonstra uma logística respeitável, para quem não compõe uma frase de francês conseguir escrever seis páginas nesse idioma é notável, conseguiu seguramente ajuda de alguém e imprimiu não sei quantas cópias em frente e verso para andar a distribuir por aí. Mas o mais interessante mesmo é a história em si. O Dr. Jacky Chan diz-se médico de investigação, que exerceu a sua profissão em São Francisco, que trabalhou contra sua vontade em projectos de armamento secreto, que foi perseguido pelo FBI e pela CIA, que por causa disso foi abandonado pela família, que este preso três vezes, mas das três vezes ganhou os processos e que espera uma indemnização de cem milhões de dólares. Como é médico propõe-nos também a sua ajuda (ele próprio há mais de vinte anos que não adoece seguindo os mesmos conselhos que nos oferece), diz-nos onde podemos encontrá-lo ou onde podemos deixar recado se quisermos contactá-lo. No fim da primeira página deixa uma nota manuscrita em inglês "I Love You very much! Because you are French! I believe you are a good person!!! This paper is only about 1% of my Story! I have no money to print my story...". Se for verdade tudo o que o Dr. Jacky Chan conta, a sua história é de facto verdadeiramente incrível. Se não é verdade, então é o personagem que se apresenta perante nós, em plena cidade, na "vida real", que é absolutamente genial. Ver esse personagem num filme, ou num palco, ou numa qualquer obra de ficção seria uma fraude. É encarná-lo autenticamente, na rua, que o torna na mais perfeita materialização do artista. Acho a segunda hipótese deveras muito mais interessante.

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terça-feira, dezembro 05, 2006

Música do CPE: Si belle Cibelle

Muda novamente a música da juke box da coluna da direita, e voltou a música brasileira com "Só sei viver no samba" de Cibelle. Uma das coisas que mais me fascina da música brasileira é a capacidade de ir incorporando outras influências sem nunca perder a sua identidade, enfim a essência da mestiçagem. Vem de longe essa capacidade, o Choro que já tem (acho eu) mais de cem anos misturou música africana com danças de salão europeias, a Bossa Nova misturou Samba com Jazz, Tropicalismo misturou Bossa Nova com Rock, e continua, Chico Buarque foi buscar a música charme europeia, Jorge Ben o R&B, Lenine a música pop dos anos 90, e por aí a fora, e no entanto tudo soa tão brasileiro, antes do mais brasileiro. E conseguem sempre cantar as coisas mais tristes naquela forma tão alegre, a transbordar felicidade. Lembro-me de uma conversa com a A. (que é brasileira) no Gevodão em que lhe perguntávamos como é que eles conseguem cantar canções tão tristes de modo tão alegre. Ela negou: "Não é triste, Não!", quer dizer a canção não é triste, pode falar de coisas tristes mas não é triste. A. tentou explicar o inexplicável, falou de Noel Rosa, e Pixinguinha, e Geraldo Baptista, e Cartola, mas não dá para explicar, só sentindo mesmo, é visceral (tal como não se pode explicar como é que o Fado pode falar de coisas alegres de maneira triste, é simétrico). Cibelle dá a resposta possível "Só sei viver do Samba". Cibelle, como diria o Ivan Nunes é coisa séria, nasce no meio do Samba-Rock e do Samba-Reggae, mistura com música electrónica (e não sei o quê mais) e dá um resultado que nem vos conto. Este tema é do primeiro álbum "Cibelle", entretanto já saiu um segundo "The Shine of Dried Electric Leaves" (sim, ela também canta em Inglês) que não é nitidamente tão bom quanto o primeiro, ainda assim é Excelente.





Só sei viver no samba
Letra

Só sei viver mesmo se for num samba
Só sei viver mesmo se for assim
se na maior, só sei viver mesmo se for num samba
Só sei viver mesmo se for um samba
Só sei viver mesmo se for assim, don don din

Seja samba de roda, batucada
Samba de noite enluarada
Samba que nunca vai ter fim

Seja de Noel Rosa ou de Cartola
Ou de Paulinho da Viola
Felicidade sem mais fim

Porque samba é pura emoção
Que vem do coração
Que vem do coração
Que chora de prazer

Porque o samba é pura emoção
Que vem do coração
Que vem do coração
Que chora de prazer

Só sei viver mesmo se for num samba
Só sei viver mesmo se for assim
e na maior, só sei viver mesmo se for um samba
Só sei viver mesmo se for um samba
Só sei viver mesmo se for assim, don don din

Seja samba de roda, batucada
Samba de noite enluarada
Samba que nunca vai ter fim

Seja de Noel Rosa ou de Cartola
Ouvir Paulinho da Viola
Felicidade sem mais fim

Porque o samba é pura emoção
Que vem do coração
Que vem do coração
Que chora de prazer

Porque o samba é pura emoção
Que vem do coração
Que vem do coração
Que chora assim
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Adenda ao post anterior - je suis tout à fait d'accord (ou presque)

O André Belo comentou (en français) o meu post anterior. Estou essencialmente de acordo com o André, apesar do que possa parecer também prefiro que o Le Pen leve uma g'anda tareia eleitoral. E pergunto-me até se o PSF não teria interesse em viabilizar as candidaturas de extrema-direita. Mas há que separar a questão de princípio das circunstâncias políticas, e a questão de princípio é de saber se deve haver um nível de controlo de uma candidatura presidencial para além das assinaturas de cidadãos. O André é frontalmente contra, eu acho que há bons argumentos a favor e contra (a única nuance de opinião).
Independetemente dessa questão não deixa de ser estranho um candidato que tem sistematicamente mais de 15% nas presidenciais não consiga reunir 500 apoios num universo de 48000 eleitos. Se a Frente Nacional está fora do sistema (que é democrático, lembre-se) dever haver uma razão. O que me agradou no texto de Patrick Jarreau é a desmontagem da argumentação de Le Pen no que toca à questão do ónus da sua putativa impossibilidade em candidatar-se. Le Pen coloca esse ónus no sistema eleitoral, e como diz o André - e bem - arrisca-se a capitalizar com isso potencial político, e é essa argumentação que não é aceitável, e é preciso dizê-lo. Mesmo que o sistema eleitoral não seja perfeito, se não conseguirem angariar os apoios necessários, exigidos por lei, para uma candidatura o fracasso é em primeiro lugar e acima de tudo de Le Pen e da Frente Nacional.

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domingo, dezembro 03, 2006

E se Le Pen não puder candidatar-se?

O mal estar arrasta-se há semanas, em lume mais ou menos brando, é muito possível que Jean-Marie Le Pen - que conseguiu nas últimas presidenciais francesas chegar à segunda volta - não esteja em condições de se candidatar para as eleições do próximo ano. O problema é com a recolha de assinaturas. Em França não basta recolher um certo número de assinaturas de cidadãos, é necessário também o "apadrinhamento" (como é designado aqui) de 500 eleitos, num universo de cerca de 48000 me todo o país. Mais ainda esses apadrinhamentos têm de vir de pelo menos 30 dos cerca de 100 departamentos e territórios do país. A razão de ser desta lei é a mesma da obrigatoriedade da recolha de assinaturas de cidadãos, para assegurar que qualquer candidato é representativo o suficiente para justificar a sua apresentação às eleições. Le Pen não conseguiu ainda é não é seguro que consiga os 500 apadrinhamentos. Aliás outro candidato da extrema direita, Phillipe de Villiers está com o mesmo problema, por ventura ainda com menos hipóteses de sucesso. Pode parecer estranho que Le Pen que já se candidatou várias vezes, e chegou mesmo à segunda volta uma vez, esteja com dificuldades este ano coisa que nunca aconteceu antes. A razão é um pequeníssimo pormenor que faz as delícias dos amantes da Real Politik: recentemente tornou-se obrigatória a publicação das listas de "apadrinhamentos". Anteriormente os eleitos de outros partidos podiam apadrinhar Le Pen protegidos pelo sigilo, agora não podem, se o fizerem será público que o fizeram. Do ponto de vista formal é inatacável esta nova disposição, os eleitores têm todo o direito de saber a quem os seus eleitos dão uma assinatura que lhes permite candidatar-se às presidenciais. Do ponto de vista prático tem consequências enormes que estão bem à vista, os eleitos por receio de ver a sua carreira política arruinada caso se venha a saber que apadrinharam Le Pen ou de Villiers preferem não fazê-lo. Pode considerar-se esta lei eleitoral demasiado Draconiana, mas se Le Pen não consegue reunir sequer 500 assinaturas em 48000 possíveis então talvez não justifique ser candidato às eleições (vale a pena ler este artigo de opinião sobre o assunto).
Outra questão, que vem por consequência, é a de saber quem vai beneficiar com esta situação. E aí, não sou especialista e ainda não vi opiniões de especialistas sobre o assunto, mas parece-me que a coisa tanto pode arranjar à direita como à esquerda, e mais que isso é palpite. Se o eleitorado que tem votado extrema-direita for seduzido pela direita tradicional, e Sarkozy tem trabalhado com afinco nesse sentido, então será a direita, o próprio Sarkozy quem ganha. Por outro lado se os votantes de Le Pen, que são numa grande parte votos de protesto, se sentirem defraudados pela não-candidatura da extrema-direita e se abstiverem massivamente, então é a esquerda, sobretudo o PS e Sègolene Royal quem vai benificiar. Por enquanto, à direita como à esquerda, toda a gente vai assobiando para o lado, e fazendo discretamente as suas apostas.

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sexta-feira, dezembro 01, 2006

Sobre o Referendo

Seguindo o repto do Arrastão está ali na coluna da esquerda um auto-colante virtual a publicitar o meu sentido de voto no Referendo sobre a Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG). Agora que já tem data marcada, constato que ainda não escrevi aqui sobre o assunto (shame on me...).
Sou favorável ao SIM, sem hesitações. É à mulher (ou quando muito ao casal, quando há casal) que compete decidir se se deve interromper uma gravidez nas primeiras semanas. Dito isto concordo com o Santiago quando diz que esta é uma questão ética. Objectivamente às dez semanas já existe uma nova vida, um novo indivíduo, saber se e até que ponto a mulher grávida pode dispor dessa vida é uma questão ética. Não há separação nítida entre um feto de 9 semanas e um de 11, há um processo contínuo mais ou menos constante que dura nove meses, saber onde é que se coloca o limite temporal para a interrupção de uma gravidez é uma questão ética. É uma questão ética, e não é uma questão fácil.
Por princípio acho que uma mulher que decide interromper uma gravidez tem uma boa razão para o fazer. Que existam por hipótese algumas mulheres que o façam sem uma razão válida não justifica que se torne a IVG num crime para todas as têm boas razões para o fazer. Mas a mulher que decide pela IVG tem que ter um razão válida para o fazer. Ninguém de bom senso defende, por exemplo, o aborto como meio de contracepção, ninguém defende o livre arbítrio. Por isso concordo também com o Santiago quando diz que Fernanda Câncio (f.) abandalha um pouco a questão (sim, eu sei que era ironia). Melhor dizendo, concordo com a f. no conteúdo mas não na forma (talvez a ironia não seja a melhor forma neste caso), porque dá a sensação que f. defende o direito da mulher à IVG sem que para tal necessite de uma justificação. A própria f. já deixou bem claro que não é essa a posição que defende. Pela minha parte acho que a IVG é uma decisão extremamente difícil, que não se pode tomar de ânimo leve, e necessita, obviamente, de uma justificação válida. Por princípio acredito que qualquer mulher (ou casal) é capaz por si só de decidir se a sua justificação é válida ou não, por isso voto SIM.

E já agora (nunca é demais repetir), a vitória do SIM não obriga ninguém a fazer o que quer que seja. Quem se opõe à IVG não será nunca obrigada a praticá-la. Quem acha que o que falta são alternativas para as mulheres poderem acolher as suas crianças em condições pode continuar a trabalhar para oferecer essas condições às mães necessitadas. A mesma coisa vai para planeamento da natalidade e a educação sexual. Nenhumas destas opções são mutuamente exclusivas.

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